Os pássaros- Luis Fernando Veríssimo

Um dos meus Hitchcocks favoritos é um dos filmes mais estranhos da história do cinema. Em "Os pássaros" o sempre explícito Hitchcock faz uma parábola obscura que só pode ser descrita como um prelúdio para o fim do mundo.

O filme é sobre os últimos dias de harmonia entre a Humanidade e a Natureza e termina — como nenhum outro filme do Hitchcock — sem resolução ou explicação, pois o único fecho adequado seria o Apocalipse.

Numa pequena cidade da costa californiana, os pássaros começam a atacar as pessoas. Ninguém sabe por quê, e o filme acaba sem que se saiba por quê. É uma história de horror sem vilões. Um filme com violência e mortes em que não aparece uma arma, salvo os bicos dilacerantes dos pássaros.

Já se disse que "Os pássaros" é, antes de mais nada, sobre a conhecida misoginia do Hitchcock, já que no filme as mulheres são os alvos preferidos das bicadas.

E tudo começa com a chegada na pequena e idílica Bodega Bay de uma loira vinda da cidade grande que irá se intrometer na rotina do lugar e subverter a ordem natural das suas relações antigas, e concentrar a fúria das aves. Mas o filme vai além do que o Hitchcock gostava de fazer com loiras. Algo está sendo anunciado. Algum desconcerto está sendo vingado.

Li que pássaros mortos estão caindo do céu em regiões dos Estados Unidos e da Suécia. Ainda não se sabe a causa das mortes.

Como no filme do Hitchcock — especula-se, pois o próprio Hitchcock não deve ter entendido bem o que estava fazendo —, os pássaros estariam tentando nos dizer alguma coisa.

Pássaros caindo do ar são quase mais perturbadores do que pássaros nos atacando, pois sugerem um desconcerto sem refúgio, do qual não se escapa nem voando. Podemos viver com a ideia de pássaros retomando o mundo, mas não com a ideia de um mundo irreparável caminhando para o nada. Depois de pássaros caindo do céu vêm mortos saindo das sepulturas, o Juízo Final, sobem os créditos e Fim.

Ou então descobrirão causas perfeitamente racionais para a morte dos pássaros e tudo continuará como antes. Bodega Bay, por sinal, ainda existe.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

TEMPO E CONTA-Laurindo Rabelo

Antes, quase ou nunca - Clarice Lispector

O segundo- Carlos Drummond de Andrade