BANZO- capítulo 6


Uma história em 12 capitulos e 1 epílogo

Capitulo 6

" - O que estamos fazendo?"

"- O que parece?"

"- Eu sei o que parece,mas o que realmente estamos fazendo?

"- Não foi pra isso que voltamos?"

"- Foi?"

"- Para que estão? Ver nossa antiga casa como dois velhos saudosos?

"- Não é isso que somos no fundo?"

"- Não,é o que somos na superfície."

"- ..."

"- Mais alguma pergunta velhinho?"

"- Por que trouxemos ele?"

"- Não fazemos isso há cinquenta anos. Podemos precisar de ajuda."
Não precisávamos. Eu preparava a rede com a mesma destreza de sempre. Meu irmão remava com os braços firmes na direção dos peixes que ele sempre soube onde encontrar. O garoto de 14 anos nos perguntava de nossas cicatrizes. Meu irmão inventava histórias vagas, distantes e fantasiosas que o garoto fingia acreditar. Tudo parecia certo. Meu irmão parou o barco e ficou em silêncio. Um silêncio tão profundo que o próprio mar respeitava. Finalmente perguntou.

"- A rede está pronta?"

"- Sim."
E com a serenidade de quem cumpre um ritual milenar a jogamos no mar.
O pescador estava de volta.
Uma pequena multidão nos esperava com curiosidade na areia da praia. Apostava-se o que dois velhos estranhos e um moleque conseguiriam no mar. Homens,mulheres,crianças,jovens, velhos e ELA. Nosso novo barco voltou carregado de peixes como há muito tempo não se via. Alguns velhos pescadores finalmente nos reconheceram e nossos nomes e histórias de juventude estavam em todas as casas e em todos os bares. Não sem uma dose de exagero (pois como se sabe,o tempo transforma fatos em histórias,e histórias sempre obedecem a quem as conta)
Preparamos nosso jantar.Comemos.Lembramos com os velhos e jovens que nos cercavam os fatos antigos transformados em histórias. Bebemos e deixamos que tantas histórias não nos pertencessem mais. O que era secreto continuava secreto. Fomos dormir em redes colocadas nas árvores a beira mar a espera do que nos prometia o amanhecer.
Tudo parecia certo.
Antes de dormir meu irmão dizia.
"- Que estranho. Sentir tanta vida dentro de mim e estar tão perto da morte." Eu ouvi e não escutei. Deixei que a embriaguez se transformasse em sono. Sonhei meus sonhos distantes de jovem pescador. Acordei de madrugada. Meu irmão colocava seu barco no mar e penetrava decidido como sempre nas águas escuras.
Sozinho. Sem nenhuma estrela a mostra para lhe fazer companhia.
Seus pés nunca mais pisariam aquelas areias.

Fim do capítulo 6


Continua

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

TEMPO E CONTA-Laurindo Rabelo

Dois primeiros blocos do debate

Homem rosa, mulher azul - Fabrício Carpinejar